07/08/2010

Por que não, tio Witt?

 

A provocação foi aceita. Afinal, quando se crê ter armas para o combate e quando há gozo mesmo na derrota, fica difícil levar o tapa e dar-se por contente.

Devo encarar a provocação do Ad, não como exclusivamente sua, pois como se diz na Antigona, no momento que o rei sabe da desobediência da jovem: Não devemos confundir as más notícias com o mensageiro.

Devo tentar desfazer a armadilha que Wittgenstein fez à psicanálise e tenho poucos recursos para isso. Em primeiro lugar, não sei até onde mais ia seu argumento contra a psicanálise. Também devo dizer que uma ferramenta que posso me valer é dos argumentos ulteriores da psicanálise – ou seja, aqueles que Freud não chegou a levar a diante.

Edipo

Dito isso, vejamos o que nos diz Wittgenstein:

 

"Freud refers to various ancient myths in these connections [dreams], and claims that his researches have now explained how it came about that anybody should think or propound a myth of that sort. Whereas in fact Freud has done something different. He has not given a scientific explanation of an ancient myth. What he has done is to propound a new myth. The attractiveness of the suggestion, for instance, that all anxiety is a repetition of a anxiety of the bird trauma is just the attractiveness of mythology. 'It is all the outcome of something which happened long ago'. Almost like referring to a totem. Much the same could be said of the notion of an Urzene [ou 'cena primordial']. This often has the attractiveness of giving a sort of tragic pattern to one's life. It is all the repetition of the same pattern which was settled long ago. Like a tragic figure carrying out the decrees under which the fates had placed him at birth. Many people have, at some period, serios trouble in their lives - so serious as to lead to thoughts of suicide. This is likely to appear to one as something nasty, as a situation too foul to be a subject for tragedy. And it may then be an immense relief if it can be shown that one's life has the pattern rather of a tragedy - the tragic working out and repetition of a pattern which was determined by the primal scene." (L. Wittgenstein, 'Conversation on Freud' in 'Lectures and Conversations on Aesthetics', Psychology and Religious Belief, p. 51).

 

É verdade que Freud propõe um outro mito e que sua explicação dos mitos como reinveções de um mito primordial não respodenria de forma direta o que são mitos. O problema de objetar isso à Freud é que Freud não tem elementos para dizer o que deve dizer, o que ele tenta comunicar é que os mitos são formações psíquicas e não tentativas de explicação com valor de verdade. Freud sabe que não diz nada novo quanto aos mitos; o que ele faz é situar onde na vida da alma humana devemos fazer a compreensão dos mitos.

Ao propor um novo mito Freud buscou caracterizar dentro de suas referências culturais (fundamentalmente clássicas) o que corresponderia àos processos psiquicos que logogênese e psicogênese. Tentou demontrar que o peso da lei que o próprio Édipo faz cair sob seus olhos é o mesmo peso que tem para o psiquismo adquirir os limites da linguagem, o pai da psicanálise queria dizer que assim como o cumprimento de um designio liberta, a lógica e a linguagem libertam, pois o primeiro ordena o mundo e a segunda, remete o mundo. Em suma, Freud propõe um mito como metáfora, ele não pede que creiam nesse mito. É por isso que a psicanálise é para todos e mesmo aqueles que tem sérios problemas com a psicanálise podem completar seu tratamento sem jamais crer na psicanálise. (A transferência é com o analista, não com o modo de tratamento)

 

Os usos dos mitos são muitos: Podemos falar deles, mas falar dos mitos como atrativos ou como coisas curiosas é somente uma possibilidade de fazer uso dessas historietas. Há os que creem nos mitos, mas crer nesses mitos hoje em dia parece tão descabido quanto parecia aos gregos antigos (Acreditavam os Gregos nos seus mitos, Paul Veyne). Contudo, há uma outra utilização, a da psicanálise. A utilização dos mitos e da tragédia nela é metafórica. (agradeço a oportunidade de dizer isso publicamente, Ad), mas metáforas não são meramente figuras de linguagem. Metáforas são formas de dar a entender, dizer tudo dizendo pouco. É algo necessário nas nossas vidas. O peso dramático de uma vida pode estar resolvido ou resumido em um jogo de palavras e tornar o peso de viver até mesmo num chiste – desses chistes onde rir é fundamentalmente aprender. Crer num mito, assim como crêr numa cena primordial é possivelmente uma das formas de compreender sua finitude, a finitude de sua linguagem e do próprio corpo. É com base na compreensão da nossa incompletude que nos alçamos a aceitar a antiguidade do mundo. A teoria da psicanálise tentar demonstrar através dos mitos que antes é verdadeiro que o mundo nasce em nós, que é verdadeiro sermos criadores do mundo. Entretanto, diferentemente da razão, que dá a mesma lição porém com a crença de que a verdade é o que torna os homens sabedores dessas distinções, os mitos mostram que há desejos que nascem a partir do momento que a ruptura, homem x mundo se faz. O quanto essa ruptura se faz e de qual forma, não é minha intenção debater. Em outras palavras, o mito é a formação psiquica que nos avisa da nossa incompletude de ser existente e que nos dá, mediante o reconhecimento da incompletude, a feliz informação de que ainda que incompletos há um mundo com uma certa ordem onde podemos pinçar pedaços daquilo que pensávamos ser. (heróis, gênios, pessoas boas, pessoas desejadas, enfim, toda sorte de criações humanas nas quais encontramos algum alento).

Totem

Ainda que os estudos de mitos estivessem ocorrendo ao mesmo tempo que Wittgenstein desenvolvia sua obra, o que torna gênio contemporâneos incomunicáveis, se wittgenstein estivesse vivo, eu perguntaria à ele, com todo respeito que ele merece: por que não aceitar essas razões, tio Witt?

 

16 commentaires:

  1. Bom post Fernandito!

    Tu me conheces, mas para quem possa estar lendo desavisado de um contexto, não conheço a psicanálise a ponto de poder criticá-la. O meu papel aqui é vestir um certo ceticismo para compreender melhor. Uma das críticas à psicanálise que a Murdoch faz em seu livro é o uso de um jargão especializado que pode mascarar pseudo-verdades, transformando-as em verdades evidentes. Nessas horas o cético é útil pq provoca a exploração de conceitos.

    Então, sigo com meu papel aqui de levantar questões. Gostaria de ler esse texto de Witt na integra para ver bem do que se trata. Talvez Witt não se opusesse ao uso de mitos na psicanálise, talvez ele não teria problemas em aceitar as razões que enumeras visando a prática psicanalítica. Não tenho idéia e talvez o texto integral pudesse dar indícios de uma resposta sua. Mas gostaria de restringir-me ao tema dessa passagem porque ele trata de uma dificuldade minha com a psicanálise: ainda não consigo colocá-la em uma ordenação de conhecimento. O que ela faz, em última análise, é ciência? É filosofia? É apenas uma técnica para fazer as pessoas viverem melhor? O que exatamente é?

    Estas questões se conectam com a passagem de Wittgenstein porque nela ele afirma não ver, na teoria freudiana dos sonhos, uma explicação dos sonhos, mas sim uma mistificação, ou seja, em última análise, a construção de um conto, digamos assim, que tem o efeito de "aliviar" (relief) o ser humano diante a seus erros e problemas, muito semelhante ao próprio mito que Freud usa como metáfora.

    De fato, o uso de metáforas por Freud "são só metáforas", como bem dizes. Mas a questão dessa provocação parece-me ser ulterior. Se fosse apenas sobre o uso das metáforas creio que salvaste nosso amigo Sigmund muito bem! Mas penso que não diga tanto respeito ao uso de mitos pela psicanálise mas, mais fundamentalmente, sobre a possibilidade da própria psicanálise constituir-se como não mais que um mito. Como se a teoria que tenta explicar nossos sonhos, ou nossas neuroses, não fizesse mais do que um dos tantos mitos de criação que aparecem para unificar fenômenos e assim pacificar almas. De fato, temos que concordar com tio Witt que gostamos de tragédias, elas são belas. E ver uma tragédia em nossa vida é sempre interessante. Tratar o comportamento de alguém como refletindo uma causa obscura e inevitável, "fundante", que destina a pessoa a fazer o que faz pode muitas vezes passar a idéia de explicar o comportamento deste alguém, assim como Adão, Eva e o Éden "explicam" o sofrimento no mundo.

    Nesse caso, quando dizes então que "metáforas são formas de dar a entender" e que, ao mesmo tempo, "Freud não tem elementos para dizer o que deve dizer" estás, parece-me, re-afirmando a posição de Wittgenstein. Pois é isto que fazem as mitologias quando propõe-se a "explicar": sem os elementos para poder dizer o que querem, vestem os fenômenos de metáforas como formas de explicá-los mas sem explicar "cientificamente", apenas os tornam, em certo sentido, unificados e, portanto, compreensíveis. Este é o ponto que vejo nebuloso. No fim das contas, parece-me que concordas que Freud em sua teoria dos sonhos não explica os sonhos, não dá uma "scientific explanation", é isso? Se for assim, restringindo-nos a esta passagem, no fim das contas concordas com Wittgenstein?

    RépondreSupprimer
  2. Ce commentaire a été supprimé par l'auteur.

    RépondreSupprimer
  3. O que eu postei aqui antes foi um apanhado de como a psicanálise nasceu, como se desenvolveu e transformou. Estas questões que Witti e Murdoch levantam foram ou são muito pertinentes pois elas dizem respeito a um modo de praticar a psicanálise que já foi superado a nivel teorico mas que permanece sendo usado e compreendido por muitos como o método psicanalitico.
    A psicanálise tem com a filosofia uma relação dialética, afeta a filosofia e é por ela afetada.
    Embora Freud repudiasse os filósofos, foi afetado pela filosofia de Schoppenhauer e Nietzche. Lacan superou a linguagem mecanicista e biologista de Freud usando todo jargão da filosofia moderna de Frege a Hegel.
    Depois do almoço vou tentar algumas respostas mais de perto às tuas questões Ad.

    RépondreSupprimer
  4. Bem tem várias coisa embutida na tua colocação Ad.
    Vou tentar destacá-las: 1- A acusação de Murdoch de que a psicanálise faz uso de um jargão especializado que pode mascarar pseudo-verdades, transformando-as em verdades evidentes.
    2-Tu perguntas se:"O que ela faz, em última análise, é ciência? É filosofia? É apenas uma técnica para fazer as pessoas viverem melhor? O que exatamente é?" 3- Wittgenstein afirma não ver, na teoria freudiana dos sonhos, uma explicação dos sonhos, mas sim uma mistificação, ou seja, em última análise, a construção de um conto, digamos assim, que tem o efeito de "aliviar" (relief) o ser humano diante a seus erros e problemas, muito semelhante ao próprio mito que Freud usa como metáfora.Wittgenstein porque nela ele afirma não ver, na teoria freudiana dos sonhos, uma explicação dos sonhos, mas sim uma mistificação, ou seja, em última análise, a construção de um conto, digamos assim, que tem o efeito de "aliviar" (relief) o ser humano diante a seus erros e problemas, muito semelhante ao próprio mito que Freud usa como metáfora.4- Como se a teoria que tenta explicar nossos sonhos, ou nossas neuroses, não fizesse mais do que um dos tantos mitos de criação que aparecem para unificar fenômenos e assim pacificar almas.5-Tratar o comportamento de alguém como refletindo uma causa obscura e inevitável, "fundante", que destina a pessoa a fazer o que faz pode muitas vezes passar a idéia de explicar o comportamento deste alguém, assim como Adão, Eva e o Éden "explicam" o sofrimento no mundo.

    RépondreSupprimer
  5. A n1 é difícil de responder sem ver todo o contexto da sua crítica mas pode-se dizer duas coisas, uma a favor de sua crítica e outra contra: se a psicanálise é um discurso do fim do séc XIX e início do séc XX e criado ou inventado por um homem deste tempo ela só pode usar uma terminologia própria e nova deste tempo, seria esquisito ela usar a linguagem do Torá ou da medicina aristotélica. Existe um uso abusivo e cifrado de termos psicanalíticos que tendem a ser auto-explicativos, mas isso se dá no uso que fazem do discurso psicanalítico e não no corpo teórico. Freud é meticuloso na explicação de cada conceito que usa e ao longo da obra é possível ver a evolução de conceitos. Lacan dedica seminários inteiros a um conceito e se vale de muitos recursos para demonstrá-los.
    N2- Em parte já respondi , mas podemos dizer que a psicanálise também um discurso produzido no intervalo entre a ciência e a filosofia, não pretende ser nenhum nem outro e nesse sentido é um estrangeiro, um discurso anômalo (no sentido de ser sem nome) embora dialogue com ambos. E assim é porque o homem como homem pertence a o real e ao mundo simbólico e no mundo simbólico está dividido entre um saber de si e um não saber de si que apenas pode vir a tornar-se um saber de si, mas não necessariamente. Um homem pode viver sem o discurso da psicanálise formalizado, sem isso nunca fazer falta ou diferença na sua vida assim como se nunca tiver acesso a filosofia ou a ciência. Mas ele sempre iriá sonhar, sempre irá cometer um equívoco na linguagem, poderá ter um sintoma físico que não encontre justificativa na medicina ou na pura fisiologia. Então o que a psicanálise estuda è isso, o que está no homem como efeito de ser um ser mergulhado na linguagem, o que o torna dividido entre o mundo simbólico e o mundo natural. A formalização deste entendimento, o fato deste entendimento ter se tornado um corpo teórico e uma pretensão de intervir no sofrimento que se produz no humano como consequência desta divisão produz uma ética e não uma técnica e jamais uma intervenção a nível de comportamento. Não pretende aliviar ou reparar a condição humana, e sim retirar-nos do sofrimento inútil e improdutivo que os sintomas, frutos das equivocações do mundo simbólico no seu entrelaçamento com o mundo das imagens produz. Pretende apenas desembaraçar alguns nós mas não nos poupa, muito pelo contrário, nos leva a ssumir da forma mais singular e criativa possível o nosso “desnaturamento”.

    RépondreSupprimer
  6. Ce commentaire a été supprimé par l'auteur.

    RépondreSupprimer
  7. Respondendo a n5, n3, n4. O mito de Adão e Eva pode ter sido sim uma tentativa de falar desse desnaturamento, da nossa relação com a “árvore do conhecimento”, com o saber. Mas a teoria dos sonhos e a teoria das neuroses não é uma explicação mítica. Como a própria ciência e como a própria filosofia, em última instância qualquer discurso tem o carácter de uma ficção pois é “inventado e criado pelo homem”, pretende dizer das coisa, mas não é a coisa em si. Em si mesmo só o real. Mas mesmo assim, o discurso de Freud sobre o sonho não é um discurso mítico. A função do sonho no psiquismo humano é semelhante ao conto, ao mito, por usar a mesma linguagem metafórica, mas a explicação do processo dos mecanismos formação do sonho que Freud nos dá , demonstra a incrível antecipação que faz das atuais descobertas neurológicas. Freud era um neurologista de formação, não sei se esse fato e levado em consideração. Diferente de Jung, que era um puro “simbolista”. Essa formação de cientista de Freud e homem de leituras clássica e que o fez compreender esse laço entre o que hoje chamamos de linguística e neurociências. Os mecanismos de deslocamento e condensação que descobriu no mecanismo dos sonhos hoje se chama na linguística de metáfora e metonímia. Descreveu com esquemas simples uma teoria do funcionamento neuronal em Projeto para uma psicologia científica, que embora simples não perdeu sua validade. Resumindo, a função do sonho é dar sentido aos nossos sentimentos e sensações, pois é constitutivo do homem buscar sentido e usar a linguagem metafórica do mito para dar sentido ao mundo cru e real. Mas a linguagem que Freud usa e depois Lacan para explicar os mecanismos e a formação dos sonhos, é a linguagem das ciências vigentes na suas épocas, que não são usadas para atribuir sentido e sim explicação compartilhada. Hoje não podemos dar uma explicação da formação dos sonhos sem usar o discurso da neurociências e da linguística mas não podemos deixar de usar a linguagem da filosofia para dizer porque o homem sonha. Sonha porque deseja, deseja porque não é mais um animal sujeito apenas às necessidades. Aristóteles e Hegel podem muito nos ensinar e provavelmente ensinou Freud e Lacan sobre o desejo. Outros nos ensinaram sobre a vontade, que é outra coisa.

    RépondreSupprimer
  8. Ce commentaire a été supprimé par l'auteur.

    RépondreSupprimer
  9. Valeu Silvana!
    Uma observação rápida, a tua resposta a n1 não cabe bem no texto da Murdoch, mas isso pq nós colocamos aqui só alguns excertos e como percebestes pode ficar fora do contexto. A Murdoch não visa criticar a psicanálise em si mesma. Ela apenas diz que quando se usa a psicanálise para fazer filosofia, veste-se a filosofia de um jargão psicanalítico e isso indica um problema (como ocorre tb quando se faz filosofia baseando-se na física, por exemplo).

    Mas, fora isso, que não importa para o lance do Wittgenstein, não entendi algumas coisas:

    1) Dizes: "a psicanálise também um discurso produzido no intervalo entre a ciência e a filosofia, não pretende ser nenhum nem outro", mas porém dizes também " mas a explicação do processo dos mecanismos formação do sonho que Freud nos dá , demonstra a incrível antecipação que faz das atuais descobertas neurológicas", bem como "a linguagem que Freud usa e depois Lacan para explicar os mecanismos e a formação dos sonhos, é a linguagem das ciências vigentes na suas épocas". Ou seja, continuo confuso: a psicanálise tinha ou não tinha pretensão de ciência? E mesmo hoje, os avanços da ciência moderna não implica que se ela tinha pretensão não possa continuar tendo: hoje não podemos explicar os mecanismos da queda de maçãs sem a linguagem introduzida por Einstein, mas isso não deixa de fazer Newton um cientista. Ainda, não fica claro nem mesmo em que sentido a psicanálise teria um discurso "ENTRE" ciência e filosofia. Se o seu discurso está ENTRE, o seu objeto de estudo estaria também ENTRE? "Entre" como? Por fim, se a psicanálise não é ciência, o que é então a "explicação" da psicanálise, que se volta a um evento natural hoje tratado, como dizes, pela linguagem científica (os sonhos), mas que não é entretanto uma "explicação" de ciência? Continuo sem saber.

    2) Dizes "Não pretende aliviar ou reparar a condição humana" e também, que pretende "retirar-nos do sofrimento inútil". Ora o segundo não é também uma forma de alívio? Parece-me claramente existir um tipo de alívio na psicanálise. Ou, então, se não existe, por que diabos alguém paga para ir ao psicanalista? Só para "desembaraçar nós" e continuar sofrendo igualmente?

    O ponto do tio Witt parece-me envolver duas coisas: a psicanálise não é ciência e a psicanálise visa uma forma de alívio. Para dizer isso, ele a compara com um mito (que tb não é ciência e visa uma forma de alívio). O meu problema é que reconheci lendo Witt que não consigo entender nunca o que o psicanalista pretende com seu discurso. Ele parece-me ter uma pretensão de discurso científico e me parece sim ter uma pretensão "clínica". E com isso não estou dizendo o que é de fato, mas só o que ME PARECE, é claro. As tuas respostas ajudaram, mas continuo confuso.

    RépondreSupprimer
  10. Ce commentaire a été supprimé par l'auteur.

    RépondreSupprimer
  11. Ce commentaire a été supprimé par l'auteur.

    RépondreSupprimer
  12. Eu cometi alguns equivocos ao falar da linguagem que a psicanálise usou, repassando: quando Freud escreveu sobre os sonhos, já havia escrito o Projeto. O projeto é escrito dentro de uma proposta de explicar o funcionamento neuronal de modo científico, o esquema do "pente" que ele usa é uma tentativa de ser modelo do real, não é linguagem metafórica embora use a palavra pente pois o desenho da entrada de impulsos e saida tem o formato de um pente. Imagine a importância disso pois até então o psiquismo era descrito em termos de alma. Quando ele escreve a teoria dos sonhos, se vale dessas formulações do funcionamento do psiquismo para demonstrar uma teoria da representação da realidade no psiquismo. Quando fala de mecanismos do sonho tais como deslocamento e condensação já não esta mais falando da capacidade mental de representar e sim dos fenômenos que sofrem a representação, tal como nos mitos e fábulas, que são fenômenos da ordem da linguagem.
    A coisa é complexa. Quando Freud faz o modelo neurológico ele está fazendo ciência, pois o "pente" é um modelo, uma tentativa de reproduzir o real. Quando fala em mecanismos de deslocamento e condensação está antecipando a linguística pois ela não existia. Quando começa a formular a teoria das neuroses e usa termos da mecânica e da termodinâmica como recalque, repressão etc não está usando como modelo de representação do real, ele sabia que o inconsciente não era um lugar localizável onde conteúdos ficavam guardados e depois emergiam, eram então metáforas, analogias, uso de uma linguagem da física para demonstrar processos psiquícos. Após o modelo neurológico, Freud nunca mais voltou a essa atividade, pois não lhe interessava mais encontrar os correlatos orgânicos dos processos psíquicos embora tivesse plena concsciência da existência disso e dos rumos que a neuociência moderna tomaria ao tentar reduzir tudo ao orgânico. Escreveu sobre isso.

    RépondreSupprimer
  13. Na primeira vez que postei sobre esse assunto tentei fazer um apanhado de como a psicanálise se originou pois isso é relevante para a sua definição, mas infelizmente se perdeu. Ele começa com um cientista, mas seu discurso não pode ser mais o da ciência á medida que ele avança em suas descobertas. Seu discurso discurso não está entre, ele é entre, no sentido de recobrir um campo que fica descoberto pela ciência ou por qualquer outra disciplina. Entre o campo do real que a ciência cobre e o campo da cultura que pertence ao imaginário e ao simbólico. Não se trata da mudança de paradigma na observação de um memo fenômeno como no teu exemplo acima, mas da suspensão do olhar do cientista para o olhar do psicanalista, isso se deu claramente quando percebeu que as conversões histéricas das suas pacientes não tinham base orgânica.

    RépondreSupprimer
  14. Os sofrimentos inúteis a que me refiro, só são desfeitos por consequência dos atos psicanalíticos que são atos éticos pois "desprendem" o analisado de pseudoconfortos, fantasias ou ilusões que produzem fragilidade subjetiva. O que produz "alivio" temporário de dores mais profundas são justamente essas fantasias e ilusões que o analista não fornece e nem alimenta. Agora, há sofrimento inerente a condição humana, como a morte por exemplo para a qual a psicanálise não possui reparação, nem alivio nem remédio. O que pode é poder ajudar o analisado a suportar o desamparo que está sujeito o humano sem nenhuma fantasia, e dai poder submergir uma subjetividade mais original e mais etica,que se funde em valores menos fálicos.

    RépondreSupprimer
  15. Ad, a psicanálise não é uma coisa fácil de transmitir, por várias razões; qualquer definição exige levantar edifícios conceituais grandes, situá-los historicamente, falar de sua evolução, das mil correntes que derivaram do original, é um sistema que tem muitas entradas, é um saber de fronteiras, toca várias disciplinas, às vezes subverte-as, vira a cabeça de qualquer um, sem falar da dificuldade de falar para que não tem a experiência de divã. Falar disso tudo é difícil mas apaixonante, mas eu não tenho a habilidade de fazer o que tu fazes, de expor uma idéia de modo rápido e quase na sua totalidade, mas faço esforço para dialogar com pessoas vivas e interessadas como tu. Para finalizar, ainda podemos dizer que a psicanálise é um método de investigação de fenômenos psíquicos que não podem ser investigados de nenhum outro modo. Existe um psicanalista chamado Joel Birman, mora em SP, que fez filosofia, mestrado e doutorado e se pós doutorou em psicanálise em Paris. Ele tem muitas obras interessantes e uma delas é "Freud e a Filosofia". Ele desdobra bem toda essa questão dos campos conceituais em que a psicanálise se situa e suas relações com a ciência e a filosofia. Tenho certeza que responderá melhor suas dúvidas do que eu. Abraço

    RépondreSupprimer
  16. Bacana. Bom, ao menos fica claro que determinar exatamente onde se coloca a psicanálise não é algo trivial. E acho que isto pode até ser um bom indício, caso decorra da natureza da psicanálise (e não na natureza dos psicanalistas!!) pq nesse caso poderia estar indicando uma maior profundidade da disciplina. De qualquer modo, neste sentido, por mais que se desenhe uma defesa com relação aos argumentos do tio Witt, permanece ainda o debate.
    Abraço!

    RépondreSupprimer